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Onde comer em Tiradentes: Esqueça os lugares “gourmet” e vá pela simplicidade mineira

O Pau de Angu, no meio da roça, em um vale com vista para a Serra São José, é o restaurante mais autêntico de Tiradentes. Imagem: Shoichi Iwashita

Todo mês de agosto, desde 1997, Tiradentes abriga um já célebre festival de gastronomia, recebendo chefs importantes não só do Brasil, mas também do exterior. E é fato que o festival, em conjunto com o advento de Tiradentes como destino turístico no fim dos anos 1970, tenha impulsionado a grande variedade de restaurantes nesta cidade de apenas oito mil habitantes.

O problema é que parte desse movimento gourmet destoa dos verdadeiros valores da gastronomia e acaba se distanciando da identidade desta pequena cidade histórica do interior do Brasil, rica em tradições e ingredientes locais. Em alguns dos restaurantes mais “rebuscados” de Tiradentes estarão lá pratos com salmão (do Chile, de cativeiro, cheio de antibióticos), foie gras (importado da França) e os famigerados produtos trufados {saiba a verdade sobre o azeite trufado, clicando aqui}. E ainda tem outros pratos que são cópias — nem sempre bem sucedidas na execução — de receitas nem-mais-tão-na-moda-assim dos restaurantes do eixo Rio-São Paulo.

E, aí, começam a surgir os empreendimentos que visam o público ávido por experiências instagramáveis, como é o caso de um café, até charmoso e bem localizado, cujo principal produto são umas maçãs coloridas que chegam a custar R$ 32, são difíceis de comer, são cheias de confeitos — e chocolate belga, claro, sendo que já temos chocolate 100% brasileiro muito melhor que esses belgas importados de grandes marcas para confeiteiros —, e ainda tem nome em inglês, no melhor estilo Disney… Eu, pessoalmente, ficaria infinitamente mais feliz com uma boa torta artesanal feita com maçãs orgânicas, úmida e equilibrada no açúcar, acompanhada dos ótimos cafés do sul do Minas, uma das principais regiões produtoras de cafés especiais do Brasil… Mas seguramente não renderia tanta mídia espontânea… e likes.

Tiradentes tem ótimos restaurantes — e não fui ao Tragaluz, o mais conhecido de todos —, mas os mais rústicos ofuscam os mais pretensiosos, pois são eles que abrigam a alma, a tradição, e a comida local, da terra. Durante os quatro dias que passei lá, percebi que foi essa comida — a do forno a lenha, a dos ingredientes simples; do feijão, do quiabo, da ora-pro-nóbis, da goiabada — que me fez conectar com as paisagens, as pessoas e a história centenária da cidade. E são essas as dicas que você confere a seguir: lugares onde, na minha próxima viagem, eu quero voltar uma, duas, três vezes.

Só preciso comunicar que, uma vez que a gente entende que a pecuária é a principal causa do desmatamento da Amazônia, dos biomas e da biodiversidade brasileira, a causa número um do aquecimento global, sendo ainda uma atividade que consome quantidades vultuosas de água potável, muitos antibióticos e 50% da produção mundial de grãos para a ração — sem falar na crueldade para com os animais — o nosso guia gastronômico de Tiradentes não tem vaca e não tem porco… apesar da tradição da comida caipira estar muito baseada no comer animais. Leia mais sobre esse assunto, clicando aqui

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PAU DE ANGU: A AUTÊNTICA COMIDA DA ROÇA MINEIRA

Em um vale na zona rural, a quatro quilômetros do centro de Tiradentes e com vista para a Serra São José, o Pau de Angu é um restaurante icônico da região de Tiradentes, já que é um autêntico restaurante da roça. Tem porteira, tem horta — onde a cozinheira Leonídia Bezerra colhe as verduras e as ervas —, e os pratos clássico-rústicos da comida mineira-caipira: pastelzinho de angu com queijo, caldinho de feijão e frango caipira com quiabo, servido com arroz, feijão vermelho, jiló, angu, quiabo, abobrinha e couve, em pratos que servem de duas a cinco pessoas. Eu, que não como carne, me esbaldei no arroz e feijão com farofa e verduras e pedi para me fazerem um ovo (das galinhas criadas soltas) com ora-pro-nóbis, essa planta super comum em Minas, que é riquíssima em nutrientes, ferro e proteína (25g de proteína a cada 100g).

Dá para sentar no salão interno com cozinha aparente (onde estão os tachos pendurados), objetos de fazenda e cachaças e compotas para venda ou, então, na agradável varanda com vista para a serra. Só deixe espaço na barriga para a sobremesa, já que te espera um absurdo balcão de doces, a apenas R$ 5 por pessoa, com tudo o que você pode sonhar: doce de abóbora com coco, doce de mamão, doce de figo, cocada, goiabada e duas versões de doce de leite, uma cozida com leite, outra com leite coalho; tudo feito no fogão a lenha.

Calcule R$ 70 por pessoa, sem bebidas alcoólicas, e leve dinheiro pois o Pau de Angu não aceita cartão. Para chegar ao restaurante que abre segunda, fecha terça e reabre de quarta a domingo, das 12h às 17h, é só pegar a estrada para Bichinho e virar à esquerda exatamente antes da loja de artesanato Solino. Telefone 55 32 / 9948-1692.

CULTIVO: UM RESTAURANTE VEGETARIANO, CULTURAL E COM UMA DAMA DE MASCOTE

Voltando para o centro histórico de Tiradentes, o Cultivo é desses restaurantes conscientes para ir uma e voltar duas, três vezes. Só não é um restaurante 100% vegano por conta de dois pratos que levam queijo Catauá, um queijo artesanal local produzido na vizinha São João del Rei, feito com leite cru de gado Jersey que só come gramíneas e leguminosas nativas, tratado só com medicamentos homeopáticos e fitoterápicos, resultando em um queijo de leite puro, livre de agrotóxicos e antibióticos (mas no caso do hambúrguer de feijão com cogumelos, você pode substituir o queijo Catauá por queijo de mandioca).

Em uma casinha antiga no Largo do Ó, o Cultivo tem interior com móveis rústicos, muitos livros, mais de 500 vinis que, tocados em uma vitrola, garantem a trilha sonora, e é bem provável que você seja recepcionado pela Dama, a cachorra dos proprietários, que é sempre destaque n’O Latido, o jornal bem humorado que o Cultivo edita com outros restaurantes da cidade. Aí, a qualquer hora do dia (o restaurante não fecha entre almoço e jantar), é só aproveitar os drinques ou as cervejas artesanais da região, as saladas, os bolinhos — de moqueca ou de queijo Catauá —, o croquete de milho com ora-pro-nóbis (minha favorita), os caldos (de lentilha, de abóbora, de alho-poró), os hambúrgueres e os pratos, como a deliciosa feijoada vegana, na foto acima.

Calcule R$ 100 por pessoa, com um drinque. O Cultivo fica no Largo do Ó, 13, no centro histórico, e abre de terça a domingo das 10h à meia-noite, e o telefone é 55 31 / 98868-4928.

UAITHAI: COMIDA TAILANDESA COM TOQUES LOCAIS E OPÇÃO DE TER TUDO VEGETARIANO

Vizinho à casa do Padre Toledo, essa rica e importante figura da Inconfidência Mineira {saiba tudo sobre ele e sua casa, clicando aqui}, e na rua que leva à Igreja Matriz, o Uaithai ocupa uma casa histórica que tem uma vista linda para a Serra São José, e conta ainda com um quintal aberto onde ficam os resquícios do que foi um teatro do século 18. Com um cardápio típico tailandês, o “uai” do nome vem com as substituições de alguns ingredientes das receitas por produtos locais, como melado, queijo canastra e cachaça (mas é só). 

O Uaithai tem um cardápio bem variado, os pratos são bem feitos, e o mais legal é que, além de algumas opções sem carne, eles adaptam todas as receitas para os vegetarianos (veganos também conseguem negociar algumas opções). Para um jantar completo, calcule R$ 180 por pessoa neste restaurante que fica na Rua Direita 205 A e abre na segunda e na terça, das 13h às 16 e das 19h às 23h, fecha na quarta, abre de quinta a sábado nos mesmos horários, e domingo para almoço, das 13h às 16h. Para fazer a sua reserva, é só ligar para 55 32 / 99927-9903

DIA DA PIZZA NO RESTAURANTE DE BACALHAU ATRÁS DA MATRIZ

Nunca tinha visto na vida um restaurante cujas especialidades são, ao mesmo tempo, bacalhau e pizza. Mas essa foi a ideia dos proprietários quando abriram o Atrás da Matriz em 2001 — a 250 metros atrás da Igreja Matriz de Santo Antônio —, já que sabiam que um restaurante com um menu restrito a bacalhau tinha menos chances de vingar.

O restaurante é agradável e espaçoso, serve no jantar pizza feita no forno a lenha no jantar — com algumas opções vegetarianas: margherita e gorgonzola com abobrinha (e você pode pedir muçarela de búfala pagando mais R$ 12) — e é o único restaurante de Tiradentes que tem doce de leite diet no cardápio de sobremesas, servido com queijo minas. Perfeito para o dia que bate aquela fome de pizza… ou bacalhau?

Calcule R$ 100 por pessoa para jantar no Atrás da Matriz, que fecha às quartas-feiras, mas abre nas segundas e terças, das 19h às 23h, nas quintas e sextas, das 19h à meia-noite, e também para almoço nos fins de semana, quando funciona, tanto no sábados quanto no domingo das 13h às 23h30. O endereço é Rua Santíssima Trindade, 201, e o telefone para reservas é 55 32 / 3355-2150.

CASA DO SINO: O NOSSO CAFÉ EM TIRADENTES

Uma das características de Tiradentes é que você não precisa ir às lojas para fazer compras. Restaurantes, pousadas e cafés ou vendem tudo o que está à vista do cliente ou criam suas próprias seleções de produtos. É assim na Pequena Tiradentes, no Cultivo e também no Café do Sino, um híbrido de café, antiquário, showroom de joias do proprietário e ourives, Paulo Henrique Gastão Franco.

Apesar de servir peito de peru industrializado (corante, soja, açúcar, conservante, espessante, estabilizante e mais uma lista de aditivos químicos) e Nutella (óleo de palma potencialmente cancerígeno e três vezes mais açúcar e gordura que avelã), no Café do Sino é possível provar os grãos de café do sul de Minas — e também o café de Jacu — acompanhado de doces portugueses feitos na casa, além de bolos e pãozinho de queijo assado na hora. E é uma delícia sentar na mesa da calçada, tomar um café e ver a vida passar.

O Café do Sino fica na Praça da Rodoviária, no número 39, no centro de Tiradentes, e abre de segunda a sábado, das 10h às 19h, e domingos, das 10h às 17h. O telefone é 55 32 / 98820-0294.

CHICO DOCEIRO: A SIMPLICIDADE DE UM CAJUZINHO, DE UM CANUDINHO DE DOCE DE LEITE…

Seu Chico era uma instituição de Tiradentes, desde que começou a produzir doces em 1965 (a loja segue até hoje no mesmo endereço). Ele faleceu em 2017, mas seu filho José segue produzindo diariamente os famosos canudinhos cônicos de massa folhada fritos e recheados com doce de leite em duas texturas (umas mais cremosa, outra, mais consistente); tudo feito na casa, tanto a massa quanto o doce de leite: são quatro horas cozinhando o leite com açúcar no fogão a lenha. É um doce simples como o lugar, que lembra uma quitandinha modesta de interior, mas tem a alma de Tiradentes.

O Chico Doceiro fica na Rua Francisco Pereira Morais, 74; abre de segunda a sábado, das 8h30 às 18h, e domingos, das 9h às 16h; e o telefone é 55 32 / 3355-1900. Ah, lá você também encontra cajuzinho — amo, amo, amo —, doce de amendoim, doce de abóbora, cocada, tudo fresquinho e para ser comido no dia.

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Shoichi Iwashita

Compulsivo por informação e colecionador de moleskines com anotações de viagens e restaurantes, Shoichi Iwashita se dedica a compartilhar seu repertório através das matérias que escreve para a Simonde e revistas como Robb Report Brasil, TOP Destinos, The Traveller, Luxury Travel e Unquiet.

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