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Meissen: Quando os alemães decifraram a fórmula secreta da porcelana chinesa depois de séculos de paixão pelo “ouro branco”

Se a cerâmica surgiu no período neolítico em várias partes do mundo quase que simultaneamente — da Amazônia brasileira ao que foi a Tchecoeslováquia, passando pelo Japão do ano 25.000 a.C. —, a porcelana foi um caso único, uma invenção chinesa.

E, por séculos desde sua criação (por volta da época de Jesus), a China deteve o savoir-faire dessa variação de cerâmica que podia ser elegantemente moldada, esmaltada e pintada, e cujo resultado eram utensílios branquíssimos e brilhantes, duros, resistentes e impermeáveis.

O “ouro branco” — um belo upgrade  da fosca, terrosa e frágil cerâmica — logo conquistaria o mundo: dos vizinhos coreanos e japoneses, a muçulmanos e europeus, para quem a porcelana se tornou símbolo de poder, bom gosto e status (desde o começo do século 13, todas as casas reais importavam porcelanas da China). E uma vez que eram caríssimas — até para os imperadores chineses, as peças faziam uma longa viagem para chegar até eles —, é claro que o mundo tentou copiar a porcelana, sem sucesso (muito tempo depois, a Coreia foi o primeiro país depois da China a produzir porcelana; e, quando isso aconteceu, os japoneses passaram a sequestrar os artesãos coreanos).

Por mais de mil anos os europeus não tinham a menor ideia de como eram fabricadas as branquíssimas porcelanas chinesas feitas com pasta dura (Francesco I de Medici até havia tentado fabricar porcelana na Florença dos anos 1580, mas diante do resultado inferior, desistiu).

Mas foi a paixão e a obsessão de Augusto, o Forte, o príncipe-eleitor do Reino da Saxônia (hoje Alemanha), que fez com que alquimistas contratados por ele descobrissem a fórmula — uma mistura de caulim, feldspato e quartzo — e transformassem Meissen, essa pequena cidade próxima a Dresden, na primeira fábrica a produzir porcelana na Europa em 1708; na ativa até hoje e aberta para visitação (pense que a Manufacture de Vincennes — depois Sèvres — só surgiria na França em 1740 para competir com a Meissen).

COMO CHEGAR À MANUFATURA DE MEISSEN

E para chegar à manufatura que até hoje é estatal — e segue encantando o mundo com suas criações depois de mais de 300 anos —, basta pegar um S-Bahn (trem metropolitano) de Dresden para Meissen-Triebischtal e seguir as placas que começam na estação e vão até a fábrica, em uma agradável caminhada de cinco minutos.

Lá, além de visitar o museu (tudo bem que as melhores peças você verá em outros grandes museus do mundo), você pode ver os artesãos em ação acompanhado de um audioguide ou de um guia, e descobrir, por exemplo, que as cores das tintas aplicadas nas porcelanas antes de as peças irem para um forno queimar por 40 horas — podendo chegar a 80 — a uma temperatura de até 1400° C, são bem diferentes do resultado final (o verde musgo fosco se transforma num lindo azul brilhante depois da queima).

Assim como a China imperial mantinha uma manufatura exclusiva para o imperador (e só ele e sua família podiam ver as peças produzidas para eles; as peças que não passavam pelo critério estético eram destruídas e enterradas), Meissen nasceu como uma manufatura real, e peças belíssimas foram produzidas para os príncipes saxões aqui (sim, todas aquelas que você viu ou vai ver expostas no Zwinger), mas já em 1713 a produção foi colocada no mercado e encantou a Europa.

E ela nunca pertenceu a uma entidade privada: em 1830, ela passou a ser do estado da Saxônia (a Alemanha ainda não existia como país ainda); depois da Segunda Guerra Mundial, quase toda a produção era enviada para a União Soviética; e, logo após o estabelecimento da República Democrática Alemã (a Alemanha Socialista), a manufatura foi devolvida para a Alemanha em 1950 e se tornou uma empresa “do povo”. A VEB Meissen Porzellan era uma das poucas empresas rentáveis da economicamente problemática Alemanha Socialista, já que faturava em moeda estrangeira. Depois da reunificação alemã em 1990, a companhia foi restabelecida ao estado da Saxônia, que hoje é a única dona.

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O edifício contemporâneo é a porta de entrada para os visitantes na Meissen. Imagem: Shoichi Iwashita

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Perto da entrada, ainda no exterior, uma placa de porcelana conta a história da evolução da assinatura da manufatura, que, desde 1722, usa as duas espadas cruzadas como símbolo. Imagem: Shoichi Iwashita

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O corredor do museu com muitas peças expostas. Imagem: Shoichi Iwashita

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Essas peças eram usadas nas mesas durante os jantares para gerar conversas entre os convivas. Às vezes retratavam alguma fofoca local, às vezes eram divertidas. Imagem: Shoichi Iwashita

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Durante a visita, é possível acompanhar os artesãos trabalhando. Imagem: Shoichi Iwashita

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Na técnica do underglaze, a artesã pinta os motivos no prato, uma camada de porcelana é aplicada por cima antes de ir para o forno. A cor fica por baixo do esmalte. Imagem: Shoichi Iwashita

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As fases do underglaze. Imagem: Shoichi Iwashita

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Já no overglaze, a porcelana já está pronta e a tinta é aplicada por cima, antes de ir para uma queima que vai “grudar” a tinta no utensílio. A vantagem deste processo é a maior quantidade de cores que podem ser utilizadas. Imagem: Shoichi Iwashita

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As etapas do overglaze, quando a tinta é aplicada por cima do esmalte. Imagem: Shoichi Iwashita

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As muitas cores aplicadas na porcelana na técnica overglaze. Imagem: Shoichi Iwashita

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Mais uma peça de mesa para gerar conversa nos jantares. Lindo trabalho de escultura e pintura neste difícil processo. Imagem: Shoichi Iwashita

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Ao final da visita, uma belíssima loja de espera com todas as coleções recentes da Meissen, entre peças contemporâneas e releituras históricas. Imagem: Shoichi Iwashita

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Shoichi Iwashita

Compulsivo por informação e colecionador de moleskines com anotações de viagens e restaurantes, Shoichi Iwashita se dedica a compartilhar seu repertório através das matérias que escreve para a Simonde e revistas como Robb Report Brasil, TOP Destinos, The Traveller, Luxury Travel e Unquiet.

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